
POR DAN BILEFSKY
OUTUBRO 5, 2017
Quando alunos do ensino médio da Turquia chegaram para o início do novo semestre, Charles Darwin era notável por sua ausência nas aulas de biologia.
Nas aulas de religião do ensino infantil, os professores ensinam o significado não violento da palavra jihad (“lutar”) como “amor pela pátria”.
E, talvez mais significativo num país onde se vê por toda parte a imagem de Mustafa Kemal Ataturk, criador do estado turco moderno e secular em 1923, as referências ao “pai dos turcos” estão passando por uma relativização nas escolas.
Num país de maioria muçulmana que há muito vive uma polarização entre a massa religiosa e uma elite secular minoritária, os críticos dizem que a reforma de mais de 170 tópicos do currículo escolar promovida pelo governo do presidente Recep Tayyip Erdogan representou um ataque frontal à já frágil tradição de secularismo do país.
As mudanças ocorrem num momento tenso para as relações entre a Turquia e seus aliados do Ocidente após a repressão de Erdogan contra seus opositores na sequência da tentativa fracassada de golpe militar no ano passado, episódio que o novo currículo descreve como “lendário, histórico”.
“Não é nada menos que uma revolução para alterar o ensino público e garantir que uma visão de mundo conservadora e religiosa prevaleça”, disse Soner Cagaptay, diretor do Programa Turco de Pesquisa do Instituto Washington de Políticas para o Oriente Próximo.
Políticos de todos as matizes criticaram as mudanças. O sistema de ensino turco, que há muito oferece ensino secular, passou a ser alvo do escrutínio do governo após a tentativa de golpe de 15 de julho de 2016, culminando na demissão de mais de 33 mil professores e o fechamento de muitas escolas. Ao mesmo tempo, o partido da situação, Partido da Justiça e do Desenvolvimento, de inspiração islâmica, ampliou significativamente o número de escolas religiosas, conhecidas como escolas imam hatip, e promoveu o objetivo de Erdogan de criar uma geração de turcos “fiéis”.
O ministro da educação, Ismet Yilmaz, elogiou a reforma do currículo nacional como correção nacional que enfatiza uma educação com base em valores. A biologia evolucionária, insistiu ele, é complexa demais para o entendimento no ensino médio, e será oferecida no nível universitário.
O instituto de pesquisa Impact-se, de Jerusalém, analisou 117 livros didáticos na Turquia e informou no ano passado que o currículo turco incluía temas como direitos humanos, e estava aberto à evolução, igualdade de gênero, proteção do meio ambiente e aceitação de diferentes estilos de vida. “Os alunos das escolas turcas são, atualmente, ensinados a valorizar a civilização ocidental”, dizia o relatório.
Mas Hay Eytan Cohen Yanarocak, autor do relatório, disse que as novas reformas mostram que a “Turquia mudou de direção e não é mais necessariamente um estado ocidental”.
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