Gelo da Antártida revela aumento do verde no globo

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O crescimento das plantas tem sido mais acelerado do que em qualquer outro momento dos últimos 54 mil anos (Michael Stravato para The New York Times)

ESTADÃO

POR CARL ZIMMER



Há décadas, os cientistas tentam imaginar o que é que todo o carbono que lançamos na atmosfera causa às plantas. E o melhor lugar para encontrarmos uma resposta é onde nenhuma planta consegue sobreviver: as imensidões geladas da Antártida.
Ao se formar, o gelo da Antártida aprisiona bolhas de ar que, há milhares de anos, preservam amostras da atmosfera. Os níveis de uma única substância química em toda essa mistura revelam o crescimento global das plantas em qualquer momento da história. “É toda a Terra — é cada planta”, explicou J. Elliott Campbell, da Universidade da Califórnia.
Ao analisar o gelo, Campbell e seus colegas descobriram que, no século passado, as plantas cresceram muito mais rapidamente do que em qualquer outra época dos últimos 54 mil anos. Em seu estudo, publicado na revista “Nature”, eles afirmam que as plantas estão transformando dióxido de carbono em substância orgânica numa proporção 31% maior do que antes da Revolução Industrial.
Tal aumento se deveu ao dióxido de carbono que o homem lança na atmosfera, e que fertiliza as plantas, diz Campbell. A quantidade de carbono proporcionada por este aumento do crescimento das plantas corresponde a mais de 25 toneladas métricas ao ano, ou três vezes a quantidade de carbono acumulado em todas as safras colhidas anualmente no planeta.
Desde 1850, a concentração de dióxido de carbono aumentou mais de 40%. Como as plantas dependem do dióxido de carbono para crescer, os cientistas durante muito tempo indagaram se esta quantidade adicional de gás poderia fertilizá-las.
Para obter alguma medição do crescimento das plantas no mundo real, alguns cientistas construíram recintos fechados a fim de determinar as quantidades precisas de dióxido de carbono, e também o crescimento das plantas. Nestes recintos, as plantas cresceram de fato mais rapidamente com o aumento do dióxido de carbono. Mas os pesquisadores descobriram que as plantas reagiam ao dióxido de carbono de maneira distinta nas diferentes partes do globo.
Mais recentemente, passaram a utilizar satélites para medir o quão verde é a terra. Entretanto, os satélites não podem ver as folhas escondidas debaixo das nuvens — e o tamanho das folhas é o único parâmetro aproximado de crescimento da planta.
Em meados dos anos 2000, cientistas descobriram uma nova maneira de medir o crescimento das plantas: estudando uma molécula chamada sulfeto de carbonila, presente apenas em algumas centenas de partes por trilhão na atmosfera, cerca de um milhão de vezes menos do que a concentração de dióxido de carbono.
As plantas absorvem o sulfeto de carbonila juntamente com o dióxido de carbono. Assim que ele entra em seus tecidos, elas o destroem. Então, o nível de sulfeto de carbonila do ar cai à medida que as plantas crescem. “É possível ver isso em tempo real”, afirma Max Berkelhammer, cientista da Universidade de Illinois, em Chicago.
Esta descoberta levou os cientistas à Antártida. O ar que chega ao Polo Sul é tão sortido que seu nível de sulfeto de carbonila reflete o crescimento global das plantas em todo o mundo. Quando o gelo se forma na Antártida, captura bolhas de ar, criando um registro histórico da atmosfera. No ano passado, J. Elliott Campbell e seus colegas analisaram os registros de sulfeto de carbonila dos últimos 54 mil anos. No decorrer de vários milhares de anos, no final da era glacial, o gás caiu significativamente. Segundo Campbell, este declínio refletiu a retração do gelo. Com o descobrimento de novas terras, as plantas cresciam rapidamente e começavam a destruir o sulfeto de carbonila.
Desde a Revolução Industrial, o homem aumentou a quantidade de sulfeto de carbonila na atmosfera em razão de sua atividade. Mas segundo Campbell, no gelo, sua quantidade não apresentou um grande aumento, porque as plantas se encarregaram de retirá-lo.
Como a quantidade adicional de dióxido de carbono foi absorvida pelas plantas, ela diminuiu no ar, o que reduziu sua contribuição para o aquecimento global. A temperatura do planeta aumentou 0,8º Celsius desde 1880, mas o aumento poderia ser ainda maior, não fosse a expansão do verde na Terra. Persiste ainda uma questão em aberto: o que acontecerá com as plantas nos próximos anos se as emissões de dióxido de carbono continuarem crescendo. O aumento do dióxido de carbono poderá estimular um crescimento maior. Mas muitos modelos climáticos projetam que as plantas sofrerão com a elevação das temperaturas e com a mudança dos padrões pluviométricos.
“Eu me refiro a este fenômeno como uma bolha de carbono”, disse o cientista. “Vemos que os ecossistemas estão acumulando mais carbono para os próximos 50 anos, mas, a certa altura, atingiremos um ponto de rompimento”.


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