BUNDADA NO FUTEBOL


Em meados de 2000, eu ainda pensava que poderia ser um jogador profissional. Comecei a treinar no famoso Leonel, do Bairro da Liberdade. Fiz parte do grupo que disputou o campeonato de juniores de Campina Grande naquele ano. O grupo tinha suas limitações, mas também apresentava bons valores individuais, que posteriormente viriam a se destacar no futebol brasileiro. Foi o caso de Negreiros. Estava naquele Leonel de 2000, depois se profissionalizou. Jogou no Campinense, no Rio Branco do Paraná, no exterior e até no Flamengo do Rio de Janeiro. Voltou ao Campinense, na Série B de 2009, mas não deu muito certo e hoje não sei por onde ele anda.

Em um jogo bastante disputado, lembro que Dido - assim Negreiros era conhecido na época - reclamou bastante comigo, porque segundo ele, eu não tocava a bola e sugeriu que trocássemos de posição: ele viria para o meio e eu jogaria de centroavante. Neste mesmo jogo contra o Trezinho (juniores do Treze), em jogada individual, driblei dois marcadores e sofri falta na entrada da área. Ainda pensei em pegar a bola, mas Negreiros se adiantou e disse que aquela era dele. Empatamos o jogo numa bela cobrança de falta, com força e colocada. Um a um, placar final.

Nossa comissão técnica era bastante renomada. O que dizer de termos a honra de ser pupilos de Zé Lima, ou como ele gosta de ser chamado - Zé Preto. Ex-jogador e treinador, vitorioso no futebol paraibano. O auxiliar técnico era Mazinho, goleiro do Treze campeão estadual em 1989. O uniforme do Leonel era o máximo. Lembrava a Seleção de Camarões. Short vermelho e camisa verde. Fizemos uma campanha um pouco irregular naquele ano e eu fiquei decepcionado porque não realizei o sonho que eu tinha de jogar no Amigão. Contra Treze e Campinense, jogamos em nosso campinho, por trás do saudoso Tamborzão. Só 11 anos depois é que pude, enfim, jogar no Ernani Sátyro, numa brincadeira com a imprensa ; confraternização de fim de ano.

Deixei o Leonel, após o final do campeonato. Passei em dois vestibulares, Administração na UFPB (ainda não era UFCG), e Educação Física da UEPB. Dediquei-me aos estudos e desisti do sonho de ser jogador profissional. Mas nunca me esqueci das palavras do mestre Zé Preto. Durante o jogo contra o Raposinha, eu me invoquei com a quantidade de bolas roubadas pelo adversário e em um lance, decidi proteger a bola, houvesse o que acontecesse. Então usei o braço, girei na lateral do campo, protegi e quando fui cercado por três oponentes, me livrei de dois e no terceiro dei uma "bundada". O árbitro mandou seguir o lance e dei prosseguimento à jogada.

No bate-papo, ao final do jogo, Zé Preto se dirige a mim. Baixa a cabeça, coça o bigode pintado de preto e no auge de sua experiência revela:

- Basílio tem umas tiradas interessantes. Ele ao mesmo tempo faz umas jogadas de craque e falha em fundamentos básicos. Naquela hora em que você estava protegendo a bola, fez algo que eu só vi Pedrinho Cangula (pai de Marcelinho Paraíba) fazer: a famosa bundada que garante a posse de bola, quando o marcador se aproxima. 

Confesso que fiquei feliz ao ser comparado com um craque do passado, mas garanto que aquela foi a única vez que protegi a bola daquela maneira. Os olhos do mestre Zé Preto estavam atentos. Hoje em dia, prefiro proteger a pelota com os braços mesmo e só indico a bundada para quem não tem outra alternativa no calor do jogo.



Basílio Neto é jornalista e apresenta, aos domingos, o programa "Agita Gol 98", na Correio FM-Campina Grande. 

http://tunein.com/radio/R%C3%A1dio-98-FM-%28Campina-Grande%29-981-s108073/

@basilioneto98
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